Entre os dias 08 e 14 de junho o CineSesc exibe Umbigo do Sonho, a mais completa retrospectiva já realizada dos filmes da cineasta e multiartista Paula Gaitán, que nasceu em Paris, e cresceu entre a Colômbia, o Brasil e a Europa. Com curadoria de Ava Rocha, a mostra apresenta 10 longas-metragens, 15 curtas e 2 videoclipes, além de um ciclo de debates e Masterclass ministrada por Paula Gaitán.
Com uma carreira marcada por trabalhos que exploram as relações entre imagem e som, em um diálogo constante entre o cinema, as artes visuais, a música, a fotografia e a performance, Paula Gaitán, que foi homenageada em 2021 na Mostra de Cinema de Tiradentes e na Cinemateca de Bogotá, é uma das principais expoentes do cinema brasileiro e latino-americano contemporâneo.
Alguns destaques da mostra são os filmes Uaká (1988), primeiro longa-metragem de Paula, filmado na aldeia kamaiurá no Alto Xingu; Exilados do Vulcão (2013), premiado no Festival de Brasília; o épico Luz nos Trópicos (2020), exibido no Festival de Berlim e vencedor do Olhar de Cinema; e o Canto das Amapolas (2023), filme mais recente da diretora.
O público ainda poderá assistir a um rico conjunto de filmes em que Paula Gaitán filmou encontros com diversos artistas e intelectuais como Lygia Pape, Agnès Varda, Arto Lindsay, Arrigo Barnabé, Sônia Guajajara, Jean-Claude Bernardet, Glauber Rocha, Negro Léo, Maria Gladys, além de videoclipes realizados com Elza Soares e Ana Frango Elétrico.
Após as sessões haverá um ciclo de debates com a presença de críticos e diversos artistas que participaram desses filmes. E ainda uma Masterclass, ministrada por Paula Gaitán, onde a diretora falará sobre a sua obra, desafios da escrita cinematográfica, possibilidades de linguagem, comunicação de narrativas audiovisuais e etapas do processo de execução de um filme, da ideia original à finalização.
A mostra é uma oportunidade única para o público conhecer a pluralidade da obra dessa multiartista marcada pela invenção e pela radicalidade estética.
Serviço:
UMBIGO DO SONHO - O CINEMA DE PAULA GAITÁN
De 8 a 14 de junho de 2023
CINESESC
Rua Augusta, 2075 - São Paulo. Tel.: 3087-0500
Ingressos: R$ 24,00 (inteira), R$ 12,00 (meia) e R$ 8,00 (credencial Sesc)
Mais informações em: sescsp.org.br/paulagaitan
Paula Gaitán: fronteiras fluidas, amálgamas dissonantes - Por Victor Guimarães
Paula Gaitán nasceu em Paris, em 1954, e cresceu entre a Colômbia, o Brasil e a Europa. Seu pai, Jorge Gaitán Durán, foi poeta. Sua mãe, Dina Moscovici, foi escritora, diretora de teatro e cineasta. Rodeada por diferentes formas de arte e movendo-se constantemente de lugar em lugar, Paula transformou esse estado de motus perpétuo (para lembrar o título do último romance de sua mãe) no coração de seu trabalho artístico. No interior dos filmes de Paula, é possível reconhecer seu trabalho como poeta, como fotógrafa e artista visual, sempre a irrigar seus gestos cinematográficos. Povoados de fragmentos literários e imagens de arquivo, performances marcantes e usos extraordinários do som, experimentos abundantes com texturas e composições de cor, seus filmes frequentemente nos lembram que o cinema pode ser um lugar de fronteiras fluidas. Seja em filmes, obras para a televisão, videoclipes ou instalações, o mundo de imagens moventes construído por Paula é uma força de deslocamento contínuo e troca infinita.
Em Uaká (1989), seu encontro com os povos indígenas do Xingu torna-se uma exploração sensorial da paisagem, potencializada por um exuberante trabalho com as cores resultantes da filmagem em 16mm. Em Diário de Sintra (2007), obra em que a cineasta revisita seus últimos meses passados com Glauber Rocha e seus filhos Ava e Eryk em Portugal no final dos anos 1970, a câmera funciona como uma espécie de instrumento tátil, esfregando superfícies e auscultando espaços, enquanto fragmentos de textos filosóficos, memórias e poemas preenchem a banda sonora. Em Vida (2008) e Agreste (2010), respectivamente dedicados às atrizes Maria Gladys e Marcélia Cartaxo, Paula desenvolve uma forma única de retratismo experimental, que terá continuidade em filmes como Sutis Interferências (2016), É Rocha e Rio, Negro Leo (2019) e Ostinato (2021). Gaitán se aproxima de artistas plásticos, músicos, atrizes e atores, e fabrica um método muito peculiar de estabelecer uma relação entre o retratado e a retratista, tomando emprestados aspectos formais da obra de quem é filmado e traduzindo-os em gestos cinematográficos. Em Sutis Interferências, tudo o que costuma ser descartado na banda sonora de um documentário – as palavras sobrepostas, os momentos de desacordo, o barulho do ar-condicionado – é assumido por Paula como o tema principal do filme. Ela empresta o leitmotiv da interferência, presente na obra musical de Arto Lindsay, e o traduz para o cinema, trabalhando com uma fotografia altamente contrastada, abusando dos sons justapostos e de uma montagem em múltiplas camadas.
Seus filmes têm um aspecto aparentemente contraditório: são ao mesmo tempo etéreos e densamente físicos. Como em Noite (2014), são evocações imaginativas, mas ao mesmo tempo estão sempre enraizados no investimento do corpo, na materialidade das fotografias, nas texturas dos tecidos, na presença física da paisagem. Na instalação Se Hace Camino al Andar (2021), o deslocamento se torna motivo visual e premissa fílmica, e a paisagem cresce como presença física ao mesmo tempo em que a duração transforma a coreografia repetitiva em abstração.
Mesmo em ficções narrativas ambiciosas e robustas como Exilados do Vulcão (2013) e Luz nos Trópicos (2020), o desejo de contar uma história é sempre contrabalançado por um pulso experimental. Nesses filmes, o edifício ficcional ergue-se inteiro e altivo, apenas para desmoronar em mil pedaços. A construção minuciosa da cena dá lugar a um amálgama dissonante de performances, derivas na epiderme das coisas, variações abstratas. A impressão mais marcante diante desses filmes é a de uma obra orgulhosamente rasgada por dentro, cujas entranhas somos convidados a habitar. Paula Gaitán sempre praticou um cinema que eleva o esboço à mais alta densidade artística. Seus filmes são ao mesmo tempo precisos, extremamente rigorosos e capazes de produzir a impressão vívida de um ateliê aberto à invenção. Na obra de Paula, para manter o vigor da descoberta, é preciso livrar-se de qualquer pretensão de totalidade.
Programação
DIA 08/06 (Quinta-feira)
Sessão 1 - 15h30
Se Hace Camino al Andar
Monsanto
Kogi
Sessão 2 - 18h
A Chuva no meu Jardim
Agreste
19h - ABERTURA
Sessão 3 - 20h30
A Mulher do Fim do Mundo - 5min
Noite - 80min
● Apresentação da sessão por Ana Júlia Silvino, Kiko Dinucci, Negro Léo, Ava Rocha e Paula Gaitán.
Sessão gratuita. Retirada de ingresso, a partir das 19h, na bilheteria do CineSesc.
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DIA 09/06 (Sexta-feira)
Sessão 4 - 15h30
Steps
Azul
Espacios Invisibles
Sessão 5 - 18h
Memória da Memória
Vida
Sessão 6 - 20h
Ópera dos Cachorros
Sutis Interferências
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DIA 10/06 (Sábado)
Sessão 7 - 15h
Luz nos Trópicos
Sessão 8 - 20h
Uaká
● Após a sessão, debate com Cristina Amaral, Ana Júlia Silvino, Paulo Santos Lima e Paula Gaitán.
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DIA 11/06 (Domingo)
Sessão 9 - 17h30
O Canto das Amapolas
Sessão 10 - 19h30
É Rocha, É Rio, Negro Léo
● Antes da sessão, apresentação com Negro Léo
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DIA 12/06 (Segunda-feira)
Masterclass - 14h30
Paula Gaitán - Parte 1
Sessão 11 - 18h
LygiaPape
Sessão 12 - 19h30
Sônia Guajajara
Let-s Dance
● Após a sessão, debate com Jean-Claude Bernardet, Mariana Queen Nwabasili e Paula Gaitán
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DIA 13/06 (Terça-feira)
Masterclass - 14h30
Paula Gaitán - Parte 2
Sessão 13 - 18h
Promessas e Previsões, Ana Frango Elétrico
Ostinato
● Apresentação da sessão por Arrigo Barnabé
Sessão 14 - 20h00
Exilados do Vulcão
● Após a sessão, debate com Fábio Andrade, Caetano Gotardo e Paula Gaitán
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DIA 14/06 (Quarta-feira)
Masterclass - 14h30
Paula Gaitán - Parte 3
Sessão 15 - 17h
Diário de Sintra
● Após a sessão, debate com Mateus Araújo, Ana Júlia Silvino, Ava Rocha, Eryk Rocha e Paula Gaitán
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